Opinião

Quem faz parte da minoria perversa dos brasileiros

Não confunda generosidade com ambição e oportunismo

Por Ricardo Noblat

Lula disse que o brasileiro é um povo muito generoso, merecedor até de um Prêmio Nobel, “apesar de uma minoria perversa”. Não disse, porém, quem a seu juízo faz parte da “minoria perversa”. Talvez não precisasse. Está aí aos olhos de quem queira enxergar.

Não necessariamente nesta ordem, fazem parte da minoria perversa os autores de notícias falsas que se tornam mais danosas quando se trata de uma tragédia bíblica como a que ocorre no Rio Grande do Sul. Notícias falsas produzem estragos irreversíveis na alma das pessoas.

Ponha-se no lugar de uma pessoa ilhada pelas águas juntamente com a família à espera de socorro que tarda porque as estradas se tornaram intransitáveis. A comida começa a escassear pouco a pouco, energia não há mais, e a bateria do celular está quase no fim.

Então, ela lê num grupo de Zap que o governo federal recusou ajuda do Uruguai e da Argentina, e que caminhões com ajuda que partiram de Santa Catarina foram impedidos de chegar ao interior do Rio Grande do Sul por falta de notas fiscais das mercadorias.

A falsa notícia atinge em cheio a esperança dessa pessoa de ser resgatada. Que sentimentos lhe ocorrem? O de ódio das autoridades que prejudicam sua sobrevivência? O de terror ou de conformidade com a morte que lhe parece próxima? O desespero que a atormenta cresce.

É claro que ela fica pior do que estava, do que jamais esteve. O instinto de sobrevivência das pessoas é tão ou mais acurado do que o dos animais, mas esses, como o cavalo que ficou cinco dias imóvel em cima do telhado de uma casa sem beber nem comer, apenas pressentem o perigo que os ameaça.

As pessoas sentem, entendem e refletem a respeito. A capacidade de resistência delas em tais condições não se compara com a dos atletas uruguaios que sobreviveram nos Andes à queda do avião que os transportava. Foi em outubro de 1972. De 45 pessoas, 16 viveram para contar.

Fazem parte da minoria perversa os que invadem o comércio das cidades alagadas, alguns de arma na mão, para saquear o que encontrarem. Não é o desespero que as move, mas a cobiça. Fazem parte da minoria perversa os criminosos que estupram mulheres em abrigos e miseráveis nas ruas.

Mas o oportunismo e a tentativa de tirar vantagem de tudo, até mesmo de uma calamidade que já custou a vida de 107 pessoas, são marcas indeléveis dos políticos em geral, à exceção de poucos contáveis nos dedos de uma mão. Vá lá: nos de duas mãos. Sou otimista.

O desastre ambiental está sendo usado no Congresso com perversidade para reivindicar um aumento extraordinário de despesas com a finalidade de auxiliar outros estados. Isso se daria por meio das “emendas Pix”, dinheiro transferido de forma veloz sem exigência de projetos nem controle.

Nasceu a ideia de reeditar um auxílio emergencial, como o da pandemia, para trabalhadores informais e desempregados. Dois projetos com esse objetivo foram apresentados pelo deputado Domingos Sávio (PL-MG) e o senador Alessandro Vieira (MDB-SE).

Se depender do senador Mecias de Jesus (Republicanos-RR), o Congresso aprovará em breve projeto que prorroga pagamentos do crédito rural e anistia a dívida dos pequenos agricultores que tenham perdido a plantação em todo o país, e não só no Rio Grande do Sul.

Magnanimidade em excesso? Não. Em outubro, o país irá às urnas para eleger prefeitos, vice-prefeitos e vereadores em mais de 5,5 mil municípios. Deputados federais e senadores contam com a ajuda deles para se reeleger daqui a dois anos ou dar saltos maiores.

Ricardo Noblat é jornalista

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