Do leitor

DO LEITOR: CULPA I

A culpa é um sentimento terrível, que nos destrói “por dentro” e tem um impacto devastador em nosso comportamento no futuro.

No entanto, eu penso que é praticamente um dos primeiros sentimentos que a criança aprende na vida. Não que os pais a faça se sentir culpada sempre que faz algo fora das normas e regras da casa ou da sociedade porque sejam maus. Afinal, eles (e tantos outros) foram criados assim e, na maioria dos casos, se tornaram boas pessoas e bons profissionais.

A criança sente-se culpada e é castigada, de uma forma ou de outra, quando quebra um objeto da casa, quando joga o prato de comida de cima da cadeirinha, quando maltrata a irmã ou irmão mais novo, quando deixa de fazer alguma tarefa que lhe foi designada, entre outras atitudes dessa natureza. Com o tempo, seus erros e enganos vão se tornando mais complexos e o sentimento de culpa e os castigos também. Aí é que começam os problemas.

Na adolescência, a criança atinge um estágio de seu desenvolvimento em que ocorrem mudanças físicas, psicológicas e sociais. Durante esse período, o corpo muda e as ideias também. Como é tudo ao mesmo tempo, é normal que aconteçam conflitos internos e externos e a criança/adolescente se torna rebelde. Toda a culpa acumulada passa a ser questionada e o (a) garoto (a) começa a entendê-la como algo que lhe foi imputado ao longo do tempo por meio de atitudes de controle dos pais e da sociedade, percebida, a partir de então, como hipócrita.

Mas, os pais não conseguem compreender nada disso. Ficam assustados com o comportamento do filho, pensam que está doente ou que se envolveu com drogas. Enfim, sequer consideram a possibilidade de que, desta vez, a culpa pode ser deles e/ou das normas e regras sociais que podem e devem ser questionadas e, por isso, precisam repensar e redimensionar a relação que estabeleceram com o filho desde a infância, antes que seja tarde demais.

Nessa perspectiva, eu defendo que pedir ou exigir que o filho faça terapia nesta fase da vida só e válido se os pais estiverem dispostos a participar de um processo terapêutico paralelo, pois, assim, poderão ponderar seus próprios conceitos, suas próprias emoções, e ações antes e durante a puberdade de seu filho e compreender o que se passa com ele de verdade.

Claro que os problemas pelos quais o filho passa podem ser decorrentes de outras causas, muito mais complexas que a culpa, mas tal comprometimento dos pais pode ter um significado importante para que ele consiga superá-los. E se não conseguir, ao menos resta aos pais o alento de que tentaram. Defendo também que, não é correto que os pais simplesmente levem o filho a um analista e esperem que ele resolva tudo por eles. Isso pode ser percebido pelo filho como abandono à própria sorte e não contribui em nada para que ele consiga controlar a raiva, liberar-se da culpa, emanar boas energias, ser mais feliz, mais realizado, melhorar a autoestima e conseguir conviver socialmente, mesmo considerando-a hipócrita. Ou, quem sabe até se engajar em algum movimento social que luta por mudanças.

Falarei sobre a realidade de crianças pertencentes às camadas mais vulneráveis da população em outro artigo, em breve.

(*) Wilse Arena da Costa, Profa. Doutora em Educação.

Palestrante, Escritora e

Membro Fundadora da Academia Rondonopolitana de Letras/MT,

Cadeira n° 10.

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