Opinião

Contagem regressiva

À exceção de um punhado de tresloucados, o país está ansioso para 2023 chegar.

 
Por Mary Zaidan

A piada fez sucesso nas redes sociais na sexta-feira, 1º de dezembro – “Hoje começa o aviso prévio mais esperado dos últimos 4 anos” -, exibindo a ansiedade de muitos para o adeus definitivo ao presidente Jair Bolsonaro. Só faltou o complemento: não tem direito a aviso prévio quem abandona o local de trabalho. Brincadeiras à parte, o presidente se ausenta do ofício para o qual foi eleito em 2018. Não faz falta alguma ao país, a não ser aos militantes da direita emergente, parte extrema dela tremulando como biruta ao vento.

Fora meia dúzia de saídas esporádicas, Bolsonaro continua enfurnado no Palácio da Alvorada. Mudo. Após perder as eleições, só falou por duas vezes: no dia 1º de novembro, quando reconheceu a derrota sem fazê-lo com clareza, e uma semana depois, em mensagem dúbia na qual apelava aos seus pelo desbloqueio das rodovias e ao mesmo tempo agradecia o apoio da turba, incentivando as manifestações antidemocráticas.

Aliados arriscaram diferentes justificativas para o encolhimento daquele que se dizia “imbrochável”. Erisipela, tristeza profunda, depressão. Tudo isso transformado em fagulhas de ânimo quando o PL pareceu ter dado ouvidos aos queixumes de fraude nas eleições, ingressando no TSE em busca de revisão do segundo turno. De tão sem pé nem cabeça, os reclames terminaram se voltando contra o partido de Valdemar Costa Neto, condenado a pagar mais de R$ 22 milhões de multa e a responder judicialmente por má-fé.

Para além do prejuízo financeiro, integrantes do PL e outros políticos à direita, incluindo vários que se elegeram na sombra de Bolsonaro, também iniciaram a contagem regressiva para o fim. A insatisfação corre solta nessa turma. De um lado, alguns tentam convencer o presidente a sair da toca e falar pelo menos com os radicais plantados nas portas dos quartéis. De outro, representantes da direita mais articulada, veem no imobilismo de Bolsonaro a chance de atrair para si os desiludidos com o “mito”, que parece ter corrido da raia e não mais teria apetite para liderá-los.

Ainda que atribuam a Bolsonaro o condão de tirar a direita do armário, os mais safos sabem que seu governo desgovernado não conseguiu ampliar forças entre 2018 e 2022. Prova disso é o volume de votos obtidos pelo capitão no primeiro turno de ambos os pleitos: 33% cravados. Pragmaticamente, têm como certo que com um terço não há vitória possível em 2026 e que há muitos empecilhos para que Bolsonaro, depois de um governo tão débil, consiga repetir a performance de 2018.

Para os apoiadores mais fiéis, tudo está para lá de difícil. Há os que tecem hipóteses radicais, entre elas a de que o presidente está se guardando em silêncio para, dias antes do fim do mandato, convocar arruaças.

Nada pode ser descartado em se tratando de Bolsonaro. Mas, pelo menos por enquanto, não há santo que o convença a usar ambientes públicos para falar de seu legado, mesmo que seja para repetir as mentiras de sempre.

Depois das eleições, ele se negou a participar da reunião do G20, em Bali, e da COP27, no Egito, onde brilhou a estrela do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva. E já anunciou que não irá à reunião do Mercosul desta semana, em Montevidéu. É o último evento internacional do ano e de sua presidência. Mas para lá vai o vice, Hamilton Mourão.

Institucionalmente, o presidente erra feio ao não representar o Brasil que o elegeu há quatro anos. Na real, sua birra faz um bem danado ao país que, à exceção de um punhado de tresloucados para os quais nem mesmo Bolsonaro parece dar bola, também conta nos dedos os dias para 2023 chegar.

Mary Zaidan é jornalista

 

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