Opinião

Por uma Justiça sem vingadores, mas severa com os golpistas do 8/1

Para que nada de parecido se repita

Ou houve uma tentativa de golpe em 8 de janeiro ou não. A mais alta Corte de Justiça disse que sim ao julgar e condenar os três primeiros brasileiros que participaram da invasão da Praça dos Três Poderes, em Brasília, destruindo partes de prédios públicos.

Não foi um ato isolado, muito menos espontâneo. Fez parte de um rosário de atos que teve início no dia seguinte ao segundo turno da eleição presidencial de 2022 com a montagem de acampamentos à porta de quartéis e o bloqueio de estradas,

Por mais de 60 dias, milhares de pessoas pediram uma intervenção militar para impedir a posse de Lula. Por ordem de Bolsonaro e concordância dos comandantes das Forças Armadas, elas foram bem acolhidas, protegidas e até ajudadas no seu intento.

Do acampamento em frente ao Quartel General do Exército, saíram os rebelados que na noite da diplomação de Lula atacaram a sede da Polícia Federal no centro da cidade e tocaram fogo em carros e ônibus sob os olhos e a paralisia de policiais militares.

Às vésperas do Natal, dali saiu o terrorista, com uma bomba fabricada no acampamento, para explodi-la no aeroporto de Brasília. A tragédia só não foi consumada porque, acionado, o mecanismo falhou. Do contrário, teria havido muitas mortes.

Lula tomou posse, o Exército impediu que a Polícia Militar do Distrito Federal desmontasse o acampamento, mas ele voltou a encher-se às vésperas do domingo de 8 de janeiro. Depois do golpe anunciado, outra vez o Exército retardou a prisão dos golpistas.

Se esse foi, como ficará registrado na História, o mais grave atentado contra a democracia desde o fim da ditadura militar de 64, os golpistas, os que os financiaram, os que os organizaram, os que os incitaram devem ser punidos sem dó nem piedade.

Para que nada parecido possa se repetir. Naturalmente, as penas a serem aplicadas devem levar em conta o grau de envolvimento de cada um no episódio. Mas perdão não cabe. Complacência, também não. Acordão, em um país dado a acordos, jamais.

Começa-se a ouvir falar que houve exagero nas condenações dos três primeiros golpistas a penas entre 14 e 17 anos. E que tamanha severidade deveria estar reservada, se tanto, aos “tubarões”. Esquece-se que aqui os números nunca são o que aparentam.

Um condenado a 17 anos de prisão nos Estados Unidos fica preso por 17 anos. No Brasil, por uma série de artifícios, 17 anos podem ser reduzidos a meia dúzia de anos. Um simples denunciado, se for pobre, pode ficar anos a fio preso sem ter sido julgado.

A democracia brasileira prescinde de vingadores não porque seja robusta, pois não é, mas porque Justiça nada tem a ver com vingança. São coisas diferentes. A página do golpe de 8 de janeiro só será virada quando a Justiça estiver completa.

Ricardo Noblat é jornalista

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