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Porque Lula faltou à Marcha com Jesus

Reconciliação custará caro

Jorge Messias da Advocacia-Geral da União e autoridades durante marcha para Jesus reúne milhares em SP - MetrópolesReprodução/Youtube/Marcha Para Jesus

“O diabo é sábio não porque é diabo, mas porque é velho”. A frase, dita pelo ator Al Pacino no filme “Advogado do Diabo”, aqui lançado em janeiro de 1998, caberia perfeitamente na boca de Lula a propósito da sua recusa em participar da “Marcha com Jesus”.

Importado da Inglaterra, onde nasceu em 1997, o evento, que congrega diferentes igrejas cristãs, repetiu-se em São Paulo na última quinta-feira e atraiu milhões de evangélicos. Convidado a participar, Lula agradeceu e preferiu mandar um representante.

Fez bem. Por mais que o representante tenha discursado ao gosto da multidão, quando citou o nome de Lula, ouviu uma estrondosa vaia. Era previsível. Os evangélicos, em massa, votaram em Bolsonaro na eleição passada. Lula venceu entre os católicos.

Estevam Hernandes, o organizador da Marcha para Jesus, fez campanha para Bolsonaro dizendo ser impossível fazer as pazes com Lula. Admitia, porém, que era “praticamente obrigatório”, ainda que a contragosto, dialogar com Lula caso ele se elegesse.

Foi-se o tempo que os donos de igrejas evangélicas de todas as denominações eram orientados pelo puro pragmatismo. Não distinguiam entre governos de direita ou de esquerda, acolhiam todos, desde que em troca obtivessem benefícios tributários.

O governo Bolsonaro foi um divisor de águas. Antes mesmo de se eleger, embora se dissesse católico, Bolsonaro, com um pastor a tiracolo, foi batizar-se nas águas do rio Jordão, em Israel. A partir daquele momento, selou sua aliança com os evangélicos.

O pastor que o acompanhou depois foi preso por suspeita de corrupção, mas isso não abalou o presidente eleito. Bolsonaro deu aos líderes das maiores igrejas evangélicas tudo o que eles pediram. A dois deles, deu também acesso às verbas da Educação.

Eles passaram a despachar dentro do prédio do ministério. O ministro, à época, era um pastor. E, mais tarde, quando ele também foi preso em São Paulo e deveria ser transferido para a sede da Polícia Federal em Brasília, Bolsonaro interveio.

Milton Ribeiro, o pastor em tela, ficou preso em São Paulo. Disseram que faltou dinheiro para pagar o combustível do avião que iria buscá-lo. Acabou solto em 24 horas. Que presidente seria mais “terrivelmente evangélico” do que Bolsonaro?

Se não for, Lula será obrigado a aproximar-se dos evangélicos. A proporção dos evangélicos em relação à população do país avançou de 15,5% para 22,2% por cento nos últimos 10 anos. O Brasil poderá perder a condição de o maior país católico do mundo.

Lula visitará o Papa Francisco no fim deste mês. Aconselhe-se com ele.

Ricardo Noblat é jornalista

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