Política

Nunca se falou tanto em democracia como agora. Não basta

O espírito golpista é forte e se mantém

Charge do AmarildoReprodução

“O senhor Getúlio Vargas não deve ser candidato [a presidente], se for candidato não deve ser eleito, se for eleito, não deve tomar posse, se tomar posse não pode governar” – disse o jornalista Carlos Lacerda no seu jornal Tribuna da Imprensa, em 1950.

Vargas governou o país como ditador entre 1930 e 1945, quando foi derrubado pelos militares que o apoiavam. Em 1950, elegeu-se presidente pelo voto popular. Tomou posse. E governou até 1954. Suicidou-se para não ser derrubado outra vez.

Lacerda foi deputado federal e depois governador da Guanabara. Apoiou o golpe militar de 1964, sonhando em ser candidato a presidente no ano seguinte. Como foi impedido de ser, rompeu com a ditadura. Foi cassado e preso em 1968. Morreu em 1987.

Muitos disseram que Lula não deveria ser candidato a presidente, se fosse que não deveria ser eleito, se fosse eleito, que não deveria tomar posse, e que se tomasse posse não poderia governar. Lula governa com dificuldades há pouco mais de 30 dias.

Não quer dizer que cessou a resistência a que ele governe quatro anos, direito que adquiriu ao derrotar seus adversários nas eleições passadas. O golpe bolsonarista de 8 de janeiro fracassou. Mas o espírito golpista de boa parte dos brasileiros se mantém.

Uma coisa é se opor a um governante eleito. A alternância no poder é um dos pilares da democracia. Outra coisa é o golpismo, que tem como objetivo substituir a democracia por um regime autoritário. A ditadura de 64 durou 21 tristes anos.

Nunca se falou tanto em democracia no Brasil como agora. Falar, porém, só não basta. É preciso ampliar as fileiras dos que a defendem e punir com rapidez os que a ameaçam. Sem contemplação. Sem dó nem piedade. Sem anistia.

Ricardo Noblat é jornalista

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