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Lucy Ramos: “Não acho que a liberação de porte de armas vá ajudar no problema de segurança pública”.

Atriz é uma das estrelas de ‘O Segundo Homem’, filme que estreou no Star Plus discutindo escalada de violência em Brasil distópico com Anderson Di Rizzi, Cleo e Negra Li.
Lucy Ramos (Foto: Diego Serres)

Lucy Ramos 

O Segundo Homem, sétimo filme na carreira de Lucy Ramos, marca uma experiência bem diferente para a atriz: acostumada a ficar na frente das câmeras desde sua estreia, aos 18 anos. No longa do StarPlus ela não só atua como produz e ainda é dirigida pelo marido, Thiago Luciano. A trama também é bem diferente do corpo de trabalho a que ela está habituada. Situada em um futuro próximo, onde o porte de armas é liberado no Brasil e a ação das milícias aumenta progressivamente, ela vive a professora Solange, cujo marido Miro (Anderson di Rizzi), decide proteger sua família se alistando na Legião Estrangeira, que chega em missão ao Brasil para ajudar as forças de segurança do país, e acaba levando a  guerra para dentro de casa.

“Foi uma experiência muito enriquecedora profissionalmente. Pude viver o set de todos os olhares possíveis: de atriz, de produtora, de fotógrafa e de tudo um pouco”, diverte-se Lucy, que está longe das novelas desde a Dona do Pedaço, em 2019. “Mas tudo só fluiu bem porque filmei com uma equipe competente e dedicada que me ajudou brilhantemente a contar a história da Solange”, diz ela sobre a trama, que tem ainda CleoNegra Li e Pedro Carvalho, entre outros, no elenco e está disponível no serviço de streaming em toda a América Latina.

O filme mostra um universo distópico, mas que, ao mesmo tempo, tem vários pontos de encontro com a realidade brasileira…
É uma história que coloca uma lente de aumento no que já está presente no nosso país. Claro que no filme trata-se de um Brasil distópico, mas será que essa realidade é tão distante assim de nós? Gosto das discussões que o longa levanta e espero que possam causar reflexões em quem for assistir. Quais foram os motivos e razões que levaram tais personagens a certas atitudes? Você agiria de qual maneira? São muitos questionamentos possíveis.

Lucy Ramos e Anderson Di Rizzi (Foto: Divulagação)

Uma das dicussões é sobre a liberação do posse/porte de armas. Qual a sua opinião sobre o assunto?
Podemos pegar como exemplo países que possuem essa liberação e mesmo assim apresentam altas taxas de violência e ainda acidentes domésticos causados por se ter uma arma em casa. Acho que existem outros caminhos. Não acho que a liberação das armas vá ajudar a resolver o problema de segurança pública, pelo contrário.

Você já passou por alguma situação de violência envolvendo armas de fogo?
Graças a Deus não.

Já atirou?
Só na ficção.

Lucy Ramos em O Segundo Homem (Foto: Divulgação)

Você tem algo em comum com Solange?
Temos pontos diferentes, mas me identifico com a força que a Solange tem mesmo diante dos conflitos. Ela arruma uma garra para continuar. Para construí-la eu me inspirei nas outras milhares de donas de casa que estão espalhadas pelo Brasil afora, todas com suas dificuldades, mas que seguem o baile.

O filme tem mulheres fortes: sua personagem, a de Cleo, Negra Li….. Como foi esse núcleo feminino dentro de um filme com uma temática tão associada, de certa forma, ao masculino?
Foi lindo trabalhar com essas mulheres tão talentosas e fortes. Acho que é um bom gancho para pensarmos que as mulheres hoje também podem estar ocupando espaços que predominantemente antes eram exclusivos dos homens. As personagens da Cleo e da Negra Li são investigadoras da polícia, isso é uma representatividade nesses postos da instituição.

Sua personagem é uma professora e, em determinado momento do filme, vemos esse contraponto entre a crianças na sala de aula e os soldados do lado de fora. A educação é sempre o melhor caminho para o futuro?
Não consigo enxergar outro melhor, a educação é a base que forma o ser humano. A própria palavra educar tem um significado tão bonito: ‘dar a alguém os cuidados para o seu desenvolvimento’ e esses cuidados serão refletidos nos adultos do amanhã. Então é triste ver os retrocessos na educação. São portas fechadas e menos chances de adultos bons e com oportunidade.

 

Você é dirigida pelo seu marido. Quais os prós e contras de trabalhar com o parceiro?
O maior pró é que sou uma admiradora do trabalho do Thiago, ele é um grande diretor e roteirista. Sempre que temos chance de trabalhar juntos eu sei que o projeto terá um olhar que é muito típico dele: sensível, generoso, poético. É lindo vê-lo trilhar um caminho tão bonito e ainda mais lindo poder fazer parte dele. Não vejo contras, sabemos o limite das nossas relações, não deixamos que problemas de casa ou do trabalho afetem o outro lado da nossa vida.

Muitos atores dizem que é difícil trabalhar com crianças. Como foi sua experiência?
Eu e a Duda nos demos muito bem logo de cara, foi o primeiro trabalho dela como atriz então procurei ficar bem próxima para dar o suporte e ter a sintonia e conexão que faz toda diferença na tela. A conexão foi tanta que a relação foi da ficção para a vida real. E ela é de uma inteligência e esperteza que logo conquistou toda a equipe ficamos apegados a essa figurinha talentosa. Um dos maiores medos da Solange é perder a filha, então na construção da personagem eu parti disso e tentei potencializar o zelo e apego. Ela é uma mãe superprotetora, tem aquele sentimento de vulnerabilidade de quando algo não está no nosso controle. Ainda não sou mãe na vida, mas imagino que ter filho é ter um pedaço do coração fora do corpo.

A maternidade é um assunto que as pessoas te cobram muito? É cansativo esse tipo de pedidos que as mulheres enfrentam?
Não diria uma cobrança direta, mas as pessoas têm curiosidade pois sabem que já tenho um relacionamento de muitos anos. Então sempre perguntam pela chegada de um filho. Parece que sentem que para a nossa relação ou felicidade estar completa falta alguma coisa. Por mais que venham até acompanhadas de carinho, essas perguntas acabam reforçando a velha ideia de que a maternidade deve fazer parte da vida de uma mulher ou então sempre faltará alguma coisa.

Lucy Ramos e o marido, Thiago Luciano (Foto: Divulgação)

Vocês filmaram antes da pandemia. Como avalia esses dois últimos anos?
Foi meu último trabalho como atriz, terminamos as gravações em dezembro de 2019 e, em março de 2020, tudo parou. Mas as negociações e venda do filme continuaram muito lentamente, pois não sabíamos o rumo das coisas. Quando a Disney comprou o filme, conseguimos finalizá-lo, e agora ele está no StarPlus. Foi um período de muita reflexão. Uma das mudanças mais significativas foi deixar a capital e ir para o meio do mato. Gosto do contato com a natureza, com os bichos. O mato cura qualquer ansiedade. Interiormente falando, passei a valorizar mais os momentos que eu passo com meus familiares e amigos, se tem uma coisa que esses tempos jogaram na nossa cara foi a nossa finitude.

O mercado mudou muito. Como você vê essas transformações?
Houve mudanças significativas no mercado audiovisual. Eu vejo com muita animação que plataformas de streaming tenham decidido investir em conteúdos nacional. Isso é mais portas abertas para nós trabalhadores da arte. O consumo de entretenimento no Brasil ganhou novas formas, acho importante estarmos atentos a elas.

Lucy Ramos (Foto: Diego Serres)

Lucy Ramos 

Já tem algum trabalho previsto para a TV?
Amo trabalhar na TV aberta, acredito que as novelas e séries tem um lugar especial no coração dos brasileiros. Logo mais estarei de volta. Eu e Thiago temos alguns projetos em andamento; o tempo que leva para cada projeto ser realizado e exibido é longo, então precisamos ter alguns encaminhados para não parar.

Quais seus planos para 2022?
Desejo que seja um ano de caminhos abertos e de renovação da nossa esperança por dias melhores, com muita saúde para todo mundo. Será um ano importante e de bastante reflexão, de pensarmos no bem do nosso país e do nosso povo, então desejo também consciência e amor ao aproximo. Especificamente sobre o filme, espero que o público assista, se questione, reflita, se incomode, fique aflito… enfim, sinta. É esse o propósito da arte. Estamos entregando um trabalho que foi feito com muito carinho e dedicação e se ele conseguir provocar quem o assistiu, nosso objetivo vai estar cumprido. Torço para que o maior número de pessoas possa vê-lo.

Revista Quem

Foto: Divulgação

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